Livros são coisinhas absolutamente libertadoras!

(E eu que disse que não ia mais fazer isso – ops! I did it again – estou aqui de novo indicando leituras ao léo/limbo virtual)

Ultimamente por aqui a leitura de um livro sempre abre caminho para outro, na sequência, de carreira. Seja obra para afirmar, complementar, escrachar ou contradizer uma a outra. Vira um conjunto. E cada conjunto de obra serve como terapia para tratar uma carência diferente do meu coreto pessoal. A atual, a de “como artista que precisa se assumir como tal”, foi “tratada” como conto a seguir. E para chegar a um bom resultado a tal terapia, foi uma prescrição de 3 obras.

Eu, insegura artista em eterna crise – “não faço, não entrego, não vendo, pois ainda não está bom”

Esses dias estou eu tentando dominar uma técnica nova de pintura. Tinha dois livros bem antigos ensinando tudim aqui comigo. Assisti mili vezes um curso on-line oferecido pela EDUK onde um professor ensina o passo-a-passo da Aquarela. Pincelada para cá, pincelada para lá eu não estava satisfeita com o resultado do meu trabalho, quando procurando, encontrei um livro bem atual sobre o assunto – Aquarela na Prática – Materiais, Técnicas e Projetos, de Curtis Tappenden. O autor fala de teoria, ensina técnica e é uma publicação deliciosa e linda de ver! Quando no final, quase na última página, diferente das outras fontes consultadas, a autor colocou um questão que me libertou! Disse que o aquarelista pode e deve trabalhar um estilo próprio. Que devemos nos permitir sair dos formalismos e das regras. Que o mundo hoje valida a busca por novas expressões. E posso dizer que três breves parágrafos mudaram um mundo inteiro por aqui! Usei o conselho e ousei o que jamais faria antes: pintei como sabia, exibi como queria, não me culpando pelo não alcance da qualidade almejada e Voilá! Feito! Antes que perfeito. Não tem problema. Matei no peito como deu. E pronto.

Ser Turner na aquarela seria o mesmo que querer ser Michelangelo na Escultura, então, como isso nunca acontecerá mesmo, fazemos o que podemos por hoje. Amanhã melhora, e com a prática, mais ainda. E vambora.

“Roube como um Artista”, sim, mas com conteúdo

Esse episódio me levou a leitura de mais dois livros. Tenho visto um deles ser bastante difundido entre uma geração uns 20 anos mais nova que eu: é o Roube como um Artista, do Austin Kleon. E me animei a “lê-lo-êlo”.

Li numa passada. Bem ao gosto da toada editorial fast-food atual, traz na capa uma chamada bem direta e vendedora: AQUI 10 DICAS SOBRE CRIATIVIDADE, (isca igual das capas das Cosmopolitans e Men’s Health da vida, rá). Mudééérninho na proposta gráfica, bem diagramado (a publicação toda é uma delicinha visual), tem linguagem fácil e é rapidamente digerível. O autor, americano, tem jeitinho de americano nerd. É presença pop multimídia, com canais diversos e diretos abertos a quem vier: Site, Face, Twitter e Insta disponíveis ao alcance de um clique. Também se encontra rapidinho vários vídeos no YouTube com drops e spoilers a respeito das averiguações que ele fez sobre criatividade – do alto de seus pouco mais de 30 anos e aparentemente pouca experiência profissional. Aliás, o livro na verdade é fruto de uma palestra que foi super bem recebida mundo afora, agraciada com muitos views, alçando o autor a palestrante para organizações como o TEDx, SXSW e The Economist, como está descrito na orelha do livro.

E ele é bom sim no que propõe, apesar do meu discurso ”anti-empático” até aqui parecer não concordar com isso.

A obra traz conceitos que liberta quem o lê. Liberta das amarras pesadas do “Não cometerás violação de direitos autorais”. Rasga os rótulos formais e pré-conceitos que cultivamos que limitam a nossa capacidade criativa e produtiva. Ajuda a fazer a roda rodar. Empodera. Impulsiona à ação e instiga excelentes novos hábitos para muitos. Dá ótimos conselhos, (que estão aí pelo ar há séculos, vamos frisar) – como esse, que eu a-m-e-i: Leia sempre. Vá à biblioteca. Há magia em estar rodeado de livros. Perca-se pelas estantes. Leia bibliografias. O negócio não é o livro com o qual você começa, mas o livro ao qual aquele livro te levará. Colecione livros, mesmo que não planeje lê-los no momento. O cineasta John Waters falou: “Nada é mais importante do que uma biblioteca não lida.” 

O jovem autor dialoga lindamente com as gerações Y e Z  (aquelas duas que tem pontos convergentes como: a procura por informação fácil e imediata, taxa em nível hard de conexão virtual – compartilhando, expondo e interagindo, que lidam com um grande fluxo de informação diariamente, e com a alta ansiedade.) No mundo atual, competitivo, líquido, com mais de 7 bilhões de humanos potencialmente criativos, onde a produção artística está pulverizada em mercados e mídias diversas como nunca antes. Onde há um lastro de séculos de história da arte em curso que pesa. Onde tanto já foi feito, e onde criar algo novo e revolucionário em arte (seja em qual campo for) é um trabalho quase impossível à primeira, segunda ou centésima vista. Kleon facilita o lidar dos novos incautos criativos com essa dura realidade com seus 10 Passos. É como se alguém nos dissesse exatamente o que se quer ouvir.

E sim, ah! Eu gostei muito do livro e me fez muito bem ler o que li! Vale ver como ele simplifica, ordena, organiza e coloca as coisas. Recomendo e acho que vale muito a leitura. Mesmo. Eu compraria de novo e acho que ele até entra na minha lista de livros-presentes. Maaaaas na minha singela opinião, de anciã representante da geração X, ele só, por si só, deixa tudo num nível um tanto quanto superficial. E eu preciso de mais.

Agora “Pense como um Artista”, com mais critério e conteúdo relevante

Achei mais! Oba! Para esse “vazio” ser preenchido, sugiro que na sequência, a leitura de um outro livro, que veio provavelmente na esteira de sucesso editorial do primeiro: Pense Como Um Artista, do Will Gompertz. O autor, uma figura, é inglês. Tem aquele jeitinho de inglês empolado. Não tem Site, nem Face ou Insta disponíveis ao alcance de um clique (só tem Twitter). Em proporção bem inferior ao primeiro se encontram vídeos seus no YouTube com drops e spoilers a respeito das averiguações que ele fez sobre arte e criatividade – do alto de seus 51 anos e experiência como Editor de Artes da BBC, ex-diretor de comunicação da Tate Gallery e outras atuações relevantes adicionadas ao currículo. O livro também tem título matador e chamadinha isca na capa para ajudar a vender. Só que aqui, a história muda de ângulo e abordagem. O conteúdo, mais profundo e convencionalmente diagramado, funciona muitas vezes como contraponto ou complemento ao que o primeiro dita. Explica e situa várias frases de efeito citadas pelo autor anterior, em suas configurações e lugares originais dentro da história da arte. Exige concentração e releitura por vezes. Eu faço o tempo todo muitas anotações, e marco inícios e fins de conceituações para me situar melhor na mensagem proposta.

(A leitura dele me levou de volta às conversas com a professora de artes do colegial Lindalva de Lorga, que, quando eu, chateada, reclamava que não conseguia criar meus desenhos como eu queria, e que só “ficava bonito” quando eu copiava, me dizia que todos os grandes artistas começaram copiando, e que mesmo utilizando-se de técnicas como a câmara escura, que seria mais ou menos como “copiar”, eles continuavam sendo artistas, alguns os mais aclamados do mundo. Me remeteu às aulas de história da arte da faculdade, dadas pelo professor Guillermo de La Cruz Coronado, um espanhol tão apaixonado pelo que ensinava, que acabava as aulas ensopado de suor. Me lembrou a minha imaturidade ao cursar uma pós Latu Sensu em Criatividade logo depois da graduação – sim esse curso existiu – onde eu não tinha ainda bagagem para potencializar tudo de ótimo que os professores tinham para passar.)

Nesse livro encontro uma espécie de “tapa-os-buracos” que o anterior deixou. Para citar apenas os mais conhecidos e transformadores artistas e movimentos, conta-se deliciosas histórias sobre Picasso, Caravaggio, Mondrian, Lichtenstein, Rembrandt, Vermeer, David Ogilvy, Bruneleschi e Sócrates. Personas notáveis não só no campo das artes pictóricas, mas passando pela publicidade, arquitetura e filosofia. Tomei contato também alguns contemporâneos que eu, confesso, não conhecia nem obra, nem história. Dei uma atualizada boa no meu repertório.

O autor também instiga o leitor a se apropriar do que o mundo concede lindamente já pronto para produzir, repensar, reinventar. Também empodera e traz conceitos importantes para se trazer para o dia-a-dia. Fala da necessidade nesse mundo atual de estabelecermos relação nova com o conceito de criatividade, e de conceitos como “economia criativa”. Faz pensar. E como já disse, Gompertz (será que de propósito, será que ele roubou?) muitas vezes dá um replay turbinado com mais conteúdo nas mesmas afirmações e conceitos do primeiro, mas com o aspecto positivo de trazer mais informação e perspectiva, que colocam os 10 conselhos do Austin Kléon numa fôrma mais válida, densa e substanciosa.

Esse post aqui é para indicar ambos, para serem lidos e pensados em conjunto.

O que Kléon traz sustenta rapidamente os famintos e incentiva a agir no curto prazo. Mas o que Gompertz traz, nutre e sustenta. Vale a pena se servir dos dois pratos numa mesma refeição. Aí teremos um bom banquete! Eu me fartei.